sábado, 4 de dezembro de 2010

A importância da lógica nas demonstrações matemáticas

Prof. Especialista Lindberg Barbosa Lira de Almeida

A lógica matemática é o instrumento utilizado na construção do conhecimento cientifico nas diversas áreas do saber humano, apresentada na maioria das vezes de forma intuitiva; noutras utilizando-se de todo o rigor matemático - quando é mal compreendida ou interpretada de forma incorreta pela falta de conhecimento específico do assunto, deixando grandes dúvidas ou dilemas referentes à área de conhecimento em questão. O texto a seguir esclarece alguns dos princípios e operações básicas da lógica utilizados em algumas demonstrações matemáticas.

Lógica; princípios; operações; demonstrações.

O desenvolvimento de uma teoria matemática

            A criação de certos tipos de conjuntos e teorias matemáticas durante muito tempo dependeu diversas vezes única e exclusivamente das necessidades dos povos, tal processo de criação foi chamado de processo sintético. Desenvolvida a teoria pelo processo sintético, os matemáticos sentiam a necessidade de eliminar dessa teoria causas estranhas à matemática e reconstruir a teoria somente com recursos da Lógica e sem nenhuma influência externa. Tal processo foi denominado processo analítico ou axiomático.
            Uma teoria desenvolvida axiomaticamente é formada por: noções não definidas ou entes primitivos, definições, proposições* não demonstradas ou axiomas e proposições demonstradas.
            As proposições demonstradas são chamadas de teoremas podendo esses ser unidos a outras proposições, definições e/ou entes primitivos formando assim novas proposições que podem ser demonstradas, isto é, novos teoremas.

Ex.: Geometria Euclidiana:

  • ponto, reta e plano são as noções não definidas ou entes primitivos;
  • segmento de reta, semi-reta, segmentos colineares, ângulo, triângulo, circunferência, etc., são as definições;
  • postulados da existência, determinação, inclusão, etc., são as proposições não demonstradas;
  • teorema do ângulo externo de um triangulo, teorema da desigualdade triangular, , teorema de Tales, teorema de Pitágoras, etc., são as proposições demonstradas.

Ex.: Mecanica Newtoniana:

  • tempo, distância e massa são as noções não definidas ou entes primitivos;
  • velocidade, aceleração, movimento uniforme, etc.; são as definições;
  • “não há movimento nem repouso absolutos” é um exemplo de proposição não demonstrada;
  • função horária do espaço do movimento uniforme: s = s0 + v.t ,  função horária do espaço do movimento uniformemente variado: s = s0 + v0 . t + (a.t2)/2 ,  etc., são as proposições demonstradas ou teoremas.
Assim a lógica, sendo o ramo da filosofia que define leis corretas para o raciocínio ou regras do pensar correto, é de fundamental importância no desenvolvimento de uma teoria matemática, seja no seu encandeamento lógico, bem como nas demontrações de suas proposições. Entre as leis ou princípios da lógica destacam-se:

  • lei da não contradição: uma proposição não pode ser verdadeira e falsa ao mesmo tempo;

  • lei do terceiro excluído: uma proposição só pode ser verdadeira ou falsa nunca um terceiro caso. 

Baseado nesses princípios podemos definir proposições como sentenças declarativas às quais se pode atribuir um valor lógico – verdadeiro ou falso. Representamos uma proposição com letras minúsculas e o seu valor lógico(VL) com as letras V (para verdadeiro) e F(para falso). Chamamos de operações lógicas as operações envolvendo proposições, nas quais o valor lógico da proposição composta, resultante da operação, depende dos valores lógicos individuais de cada uma das proposições envolvidas. As principais operações lógicas são:

  • Conjunção (operador: ^, lê-se : e)
Uma proposição composta do tipo (p^q) só tera VL = V caso VLp = V e VLq = V, em outra hipótese teremos VL(p^q) = F.

  • Disjunção (operador: v, lê-se : ou)
Uma proposição composta do tipo (p v q) só tera VL = F caso VLp = F e VLq = F, em outra hipótese teremos VL( p v q ) = V.

  • Disjunção exclusiva (operador: v , lê-se : ou p ou q)
Uma proposição composta do tipo (p v q) só tera VL = F caso VLp = VLq = V ou VLp = VLq = F,  em outra hipótese teremos VL(p v q) = V.

  • Condicional (operador: -->, lê-se : se p então q)
Uma proposição composta do tipo (p-->q) só tera VL = F caso VLp = V e VLq = F , em outra hipótese VL(p-->q)  =  V.

  • Bicondicional (operador: <-->, lê-se : p se e somente se q)
Uma proposição composta do tipo (p<-->q) só tera VL = V caso VLp = VLq, em outra hipótese VL(p<-->q)  =  F.

  • Negação (operador: ~, lê-se: não)
Uma proposição do tipo ~p só tera VL= F caso VLp=V e terá VL = V caso VLp = F.

Utilizando o princípio do terceiro excluído podemos montar as seguinte tabelas que chamamos de tabelas-verdade, pois nos fornecem de forma rápida o valor lógico de uma proposição composta para qualquer que sejam as possibilidades dos valores lógicos de cada proposição componente:


Exemplo:        Consideremos as sequintes proposições:

p: O menor número primo positivo é 2                    
q: O menor número irracional positivo é


Obviamente a primeira proposição é verdadeira e a segunda é falsa. Então:

p ^ q (O menor número primo positivo é 2 e o menor número irracional positivo é) é falsa.
p v q (O menor número primo positivo é 2 ou o menor número irracional positivo é ) é verdadeira.
p v q (Ou o menor número primo positivo é 2 ou o menor número irracional positivo é ) é verdadeira.
p -->  q (Se o menor número primo positivo é 2 então o menor número irracional positivo é ) é falsa.
p <--> q (O menor número primo positivo é 2 se e somente se o menor número irracional positivo é ) é falsa.

~p (Não é verdade que o menor número primo positivo é 2) é falsa.
~q (Não é verdade que o menor número irracional positivo é ) é verdadeira.

 Observações:

1. Definimos como:

  • tautologia toda proposição composta que sempre assume o valor lógico V independentemente dos valores lógicos das proposições que a compoe.
  • contradição ou proposição contraválida toda proposição composta que sempre assume o valor lógico F independentemente dos valores lógicos das proposições que a compoe.
  • contingência toda proposição composta que não seja nem tautologia nem contradição.

Exemplos:       ~(p ^ ~p)   :       é uma tautologia                    
                        p ^ ~p        :       é uma contradição
                        p --> ~p     :       é uma contingência
Pois:   


2. Definimos como:

  • Implicação Lógica: toda tautologia resultante da operação condicional.
  • Equivalencia Lógica: toda tautologia resultante da operação bicondicional.

Exemplos:  Mostre que p ^ q implica logicamente p v q. Indica-se: p ^ q ==> p v q.


                  Mostre que p --> q equivale logicamente a ~p v q. Indica-se: p-->q <==>~p v q.


3. Definimos como:

  • Proposição recíproca de p --> q : a proposição q --> p.
  • Proposição contrária de p --> q : a proposição ~p --> ~q.
  • Proposição contrapositiva de p --> q : a proposição ~q -->~p.

Algumas propriedades importantes surgem diretamente da aplicação da definição e implicação e equivalencia lógica e operações são elas:

1ª. -->  q  <==> ~q  --> ~p         
2ª. -->  p  <==> ~p  --> ~q


Aplicação dos princípios, operações e propriedades

1. Demonstração usando a contrapositiva

Exemplo: Demonstrar a proposição condicional : p --> q : Se x2 é ímpar, então x é ímpar.

Demonstração: A contrapositiva desta condicional é : ~q --> ~p: Se x é par, então x2 é par.
Pela primeira propriedade podemos realizar a demonstração provando a contrapositiva que equivale logicamente a condicional e bem mais simples de ser demonstrada.
Com efeito, suponhamos x par, isto é, x = 2n(n inteiro). Como x2 = 2n.2n=2.2n2, segue-se que x2 é par.

2. Demonstração por Contradição ou Redução ao Absurdo

Método baseado na seguinte equivalência lógica: ((p ^ (~q)) --> c) <==> (p --> q), que pode ser provada facilmente utilizado-se uma tabela verdade como veremos a seguir.


Tal método consiste em negar a proposição que queremos provar, mesmo ocorrendo a hipótese, e por conta dessa negação caímos numa contradição que prova que a proposição realmente só pode ser verdadeira uma vez que não pode ser falsa.

Exemplo:  Provar que o conjunto vazio é subconjunto de qualquer conjunto.

Demonstração: Suponha que o conjunto vazio não seja subconjunto de algum conjunto A, isto é, o conjunto vazio deverá ter pelo menos um elemento pertencente a ele que não pertença ao conjunto A considerado. Absurdo! Pois o conjunto vazio não possui elementos. Logo o conjunto vazio é subconjunto de qualquer conjunto.

Exemplo 2: Provar que:

Se A for subconjunto do conjunto de IN, e se:

a)       o número 1 pertencer a A;
b)      o fato de um número a pertencer a A implicar no seu sucessor também pertencer a A,

então o conjunto A = IN.

Demonstração: Seja A’ o conjunto dos naturais que não se acham em A. Então bastará provar que A’ é vazio, para demonstrar que A contém qualquer natural.
Seja então A’ = {n,n+1,..........} o conjunto de todos os naturais não pertencentes a A. Seja n o menor deles. Segue-se que n é diferente de 1, pois caso contrário pertenceria ao conjunto A.
Então, resta-nos que n deve ser maior que 1 (já que o 1 não é sucessor de nenhum outro número) n > 1. Então n – 1 é menor que n e pela construção de A’ (n é o menor elemento) conclui-se que n-1 deve pertencer ao conjunto A (já que é menor que n).
Chamemos de a o número n -1,  isto é, a = n – 1, que se acha contido em A.
Ora, se a = n – 1 se acha contido em A, por hipótese o seu sucessor a + 1 = (n – 1) + 1 = n deve estar contido em A também; então n está em A.
Aqui recaímos numa contradição: n se acha no conjunto dos números naturais não contidos em A e n se acha em A. Portanto, a hipótese de que A’ continha pelo menos um elemento é falsa, o que implica em ser A’ um conjunto vazio. Logo A contém todos os números natuais.

Essa proposição que acabamos de demonstrar é conhecida como o teorema da induçao matemática, podendo ser estendida e utilizada para provar propriedades relativas a números inteiros.
Referências Bibliográficas

1. ALENCAR FILHO, Edgard de – Iniciação à Lógica Matemática, Livraria Nobel S.A.
2. DOMINGUES, Hygino H. IEZZI, Gelson. Álgebra Moderna, Ed. Atual. 4ª edição. São Paulo, 2006.
3. EVARISTO, Jaime – Introdução à Álgebra Abstrata, Maceió - EDUFAL, 2002.
4. IEZZI, Gelson – Fundamentos de Matemática Elementar, volume 9 : Geometria Plana. 7ª Edição – São Paulo, Editora Atual, 1993. ISBN 85 – 7056 - 269 –
5. OLIVEIRA, Antonio Marmo de. SILVA, Agostinho. Biblioteca da matemática moderna – tomo I. Ed. Lisa. São Paulo, 1980.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Calculando distâncias inacessíveis com triângulos semelhantes

Prof. Especialista Lindberg Barbosa Lira de Almeida

A possibilidade do cálculo de distâncias inacessíveis se dá normalmente com o uso das razões trigonométricas, embora a idéia geral envolvida na questão é a de semelhança de triângulos, uma vez que as razões são apenas nomes dados aos quocientes obtidos entre pares de lados homólogos de triângulos retângulos semelhantes.

Triângulos; semelhanças; razões.

Calculando o raio da Terra

Um processo utilizado há muito tempo pelos gregos para medir o raio (r) da Terra consistia num observador posicionado no alto de uma torre de altura (h) observando a linha do horizonte num ponto fixo (A) formando assim um ângulo de observação (θ) e o triângulo ABC (figura 1) retângulo em A (propriedade da tangente). Tal processo tornava possível a determinação de um triangulo DEF (figura 2); semelhante ao triângulo ABC através do caso de semelhança de triângulos: AA, uma vez que se conhecia dois ângulos no triângulo ABC (90º e θ); cujos lados seriam proporcionais aos do triângulo ABC, o que permitia escrever r em função de d, e e h que são medidas acessíveis.



Assim os gregos concluíam que:

Obviamente podemos recorrer a razão trigonométrica seno (cateto oposto dividido por hipotenusa) e a tabela trigonométrica, obtendo o mesmo resultado de forma mais rápida se tornando essa forma de cálculo bem mais prática no caso de um experimento concreto. Assim fazendo


Percebemos assim a relação entre semelhança de triângulos e razões trigonométricas no triângulo retângulo como sendo a segunda um caso particular importantíssimo da primeira.

Referências Bibliográficas

1. CARMO, Manfredo Perdigão do. MORGADO, Augusto César. WAGNER, Eduardo. Trigonometria Números Complexos. Coleção do Professor de Matemática, 1992. SBM, IMPA e VITAE.

2. IEZZI, Gelson – Fundamentos de Matemática Elementar, volume 9 : Geometria Plana. 7ª Edição – São Paulo, Editora Atual, 1993. ISBN 85 – 7056 - 269 – 1.